Sobre a terceirização dos cuidados!
A cena se repete frequentemente: a criança de quase 3 anos se debate durante o atendimento no meu consultório.
A família olha sem reação e ninguém consegue impor os limites… Afinal, com nenhum membro dessa família, a criança estabeleceu um vínculo seguro, tampouco há um vínculo comigo. Infelizmente, ela só comparece no consultório nos momentos de adoecimento e consequentemente de maior fragilidade. A consulta é tumultuada, pois os pais mal toleram o choro do filho e não sabem como acalentar.
Não há olho no olho entre pais e filhos… Há, na verdade, um desencontro de informações e alguém recorre ao telefone celular para buscar com terceiros a certeza necessária para dar sequência ao atendimento pediátrico. Mas como isso aconteceu? Como o bebê tão doce ficou tão sem limites?
A fórmula usada nesses casos é a seguinte: se aparecer um problema alimentar, contrata-se uma nutricionista! Se o problema for o mal comportamento, então leva-se ao psicólogo… Se a fala atrasou, chama-se o fonoaudiólogo… e assim segue!
A família corre para atender, tão somente, a necessidade pontual de afeto pela qual a criança está literalmente gritando! Os problemas e desafios normais da infância vão sendo tratados pelo “melhor especialista da cidade” e a família seguindo impassível e à margem de seu real papel.
Não me canso de escutar que a falta de tempo justificaria essa terceirização: babás, escolinhas e creches em horário integral para crianças tão novas… assim terceiriza-se também o vínculo e os afetos, inclusive em momentos de lazer, em que terceirizam a criança às mídias como tablets e celulares, com a seguinte justificativa: ”estou muito cansado(a)!”.
Via de regra, aquela criança é cercada de benesses que, supostamente, preenchem o lugar do amor familiar verdadeiro. Aquele amor que ensina regras, na mesma proporção em que troca beijos e abraços.
Não quero jogar no colo das mães mais uma culpa, mas, sim, propor uma reflexão: como você tem criado seu filho? Você tem realmente criado o seu filho? Ainda dá tempo de mudar!
Dra. Karina Azevedo, pediatra.
Médica formada pela Faculdade de ciências médicas MG em 1997. Fez residência em pediatria pelo Hospital das Clínicas UFMG e especialista em gastro pediatria pela mesma instituição em 2001. Hoje atua em consultório particular e no Hospital Mater Dei.